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sexta-feira, março 24, 2006

«PASTELARIA

Afinal o que importa não é a literatura
nem a crítica de arte nem a câmara escura

Afinal o que importa não é bem o negócio
nem o ter dinheiro ao lado de ter horas de ócio

Afinal o que importa não é ser novo e galante
- ele há tanta maneira de compor uma estante!

Afinal o que importa é não ter medo: fechar os olhos frente ao precipício
e cair verticalmente no vício

Não é verdade, rapaz? E amanhã há bola
antes de haver cinema madame blanche e parola

Que afinal o que importa não é haver gente com fome
porque assim como assim ainda há muita gente que come

Que afinal o que importa é não ter medo
de chamar o gerente e dizer muito alto ao pé de muita gente:
Gerente! Este leite está azedo!

Que afinal o que importa é pôr ao alto a gola do peludo
à saída da pastelaria, e lá fora – ah, lá fora! – rir de tudo

No riso admirável de quem sabe e gosta
ter lavados e muitos dentes brancos à mostra »


Mário Cesariny
Nobilíssima Visão

quarta-feira, março 22, 2006

Rebaldaria

. A Angelina é quase tão velha como a Dona Joaquina mas tem pouco de anjo e prefere a tasca do Ti João à mercearia. És levada da breca, é o que ele responde quando ela lhe pisca o olho: Ó João, quando fechares o estaminé vens comigo, há mês e meio que não vejo o padeiro.
. O poeta nasceu de colher de prata na boca mas gosta de onde cheira a torresmos. Canta versos com sabor a maçã de Junho, e diz àquele navio, que navega mais que avião: "és a estrela da alvorada e a madrugada junto ao cais", sabendo que à hora de deitar terá um corpo onde morder.
. A necessidade faz o engenho se aumenta a idade. Já não se cora a face, nem só galinha nem só rainha, nem só lua cheia. No frigir dos ovos é que se vê a manteiga...

terça-feira, março 21, 2006

Mercearia

. O estabelecimento da Dona Joaquina fica no Bairro Antigo, ao lado da Loja do Mestre André. Todas as tardes vigia os putos que saem da escola, mas apanham-na sempre desprevenida: roubam-lhe fruta, normalmente maçãs, e gritam-lhe enquanto correm: Ó Jaquina, vem à esquina!
. Na mesma rua, mais acima, tem posição a tasca do Ti João, onde há pão com requeijão, e mais o que estiver ali à mão, a acompanhar com o verde tinto da terra. O Evaristo também tem lá disto.
. O poeta perde-se por esta calçada todas as terças e quintas quando sai da psicoterapia. Gosta de passear por ali vagarosamente enquanto reflecte... este Bairro cheira-lhe a tertúlia.
. Uma bela quinta-feira o poeta entra p’la mercearia dentro e pede: Ó Dona Jaquina, embrulhe-me aí um poema. Ela dá-lhe uma maçã e ele segue para casa, satisfeito, sabendo que à hora de deitar terá um verso onde morder.

Versos a martelo no Dia da Poesia

o meu amor sempre foge
o meu amor mora longe

o meu amor já se esconde
o meu amor está longe

o meu amor agora finge
o meu amor vive longe

sexta-feira, março 17, 2006

Como começou...

Andava eu para aí no terceiro ano da faculdade quando vi afixado lá numa das paredes uma coisa que dizia "Gostas de fado? Aparece dia tal às tantas horas". Eu gostava muito de fado e fiquei toda contente quando percebi que ia haver um espectáculo de fado.
Ainda nem tinha carro nem carta e fiz um esquema enorme para poder estar na faculdade, aquilo era à noite, sem ser roubada ou violada em plena "avenida dos arames" (era um acesso para os comboios que existia em Queluz).
Quando cheguei fui ter ao anfiteatro para onde estava agendada a noite de fados e não estava absolutamente ninguém. Eu sabia que o fado não era assim apreciado por magotes de gente... mas ninguém! Chiça!
Passadas umas voltas, lá descobri à entrada um rapaz novo mas mais velho do que eu que me perguntou o que estava ali a fazer. Expliquei-lhe. Ele sorriu e disse-me que não se tratava de algum espectáculo, o recado nas paredes da faculdade referia-se à ideia de formar um grupo de fado e quem quisesse entrar que aparecesse. Óóóó! Despedi-me, agradeci a explicação, e quando mes estou a ir embora aparece um senhor com uma guitarra na mão.
Voltaram a chamar-me, disseram para eu cantar qualquer coisa (que nervos, ainda me lembro, não sabia letras, nunca tinha cantado a não ser na casa-de-banho) e assim fiquei a fazer parte daquele grupo que, entretanto, já tinha mais elementos.
Foi uma das fases mais engraçadas da minha vida e passados poucos meses já mes estava a estrear na Sé e a cantar ao lado do João Braga, do António Pinto Basto, do Pedro Moutinho, e por aí fora. Uma delícia. Corri muitas casas de fados a cantar, fiz também estrada, fiz festas de estudantes, de escuteiros, eu sei lá...
Foi assim que tudo começou e apeteceu-me contar aqui esta história depois de ontem ter estado a ouvir a Prova Oral, que era sobre fado.

Obrigada Ricardo (o rapaz que estava à porta do anfiteatro e que me obrigou a cantar) e António e Eduardo (os guitarristas que me acompanharam em muitos momentos importantes e que me ensinaram muita coisa bonita).

Sniff!

terça-feira, março 14, 2006

Pensamento do dia

Não fui eu que disse...

Se o Benfica não consegue ganhar à Naval não merece ser campeão europeu.

by Koeman

Este raciocínio é bonito e como o Coisas que Tal o apoia (ao raciocínio) aqui fica publicado, para a eternidade...

segunda-feira, março 13, 2006

Prometi mas não vou cumprir

Quando soube que tinha entrado na Nova Gente prometi que iriam ter aqui episódios fresquinhos sobre coisas engraçadas que lá se passavam. Infelizmente e contra a minha vontade esta promessa vai ficar por cumprir e explico porquê:

(vai ter de ser assim)

Épé quepe lápá napa repevispistapa jápá despescopobripirampam quepe eupeu tepenhopo umpum blogplog. Epi porpor ipissopo nãopão voupou popoderper conpontarpar epessaspas coipoisaspas. Despesculpulpempem.

Acham que a malta lá da revista consegue decifrar isto? Já agora, aproveito para mandar um grande abraço à amiga de uma das colegas que, pelos vistos, é leitora aqui do Coisas.

O desafio das manias

Respondendo ao desafio lançado, posso dizer que, basicamente, tenho uma mania. Tenho a mania que sou boa! E pronto, como tenho esta mania furto-me facilmente a responder a um desafio lançado na blogosfera em que temos de escrever as nossas cinco manias. Como tenho a mania que sou boa, escrevo só uma. Ora toma, ou como diria o Artur Agostinho no anúncio dos óculos "ó larila!" (será que foi ele que inventou aquilo ou estava mesmo no guião?).

IrReSponsável

Mas porque é que eu deixo tudo para a última hora... porquê?!?

“Meme” (e não é uma ovelha)

Depois do desafio lançado pela Leididi ( O Blog do Desassossego ), cá vai:

«Cada bloguista participante tem de enunciar cinco manias suas, hábitos muito pessoais que os diferenciem do comum dos mortais. E além de dar ao público conhecimento dessas particularidades, tem de escolher cinco outros bloguistas para entrarem, igualmente, no jogo, não se esquecendo de deixar nos respectivos blogs aviso do ‘recrutamento’. Ademais, cada participante deve reproduzir este ‘regulamento’ no seu blog.»

1. Tenho a mania das listas (ver arquivos de Abril.2005 )
2. Tenho a mania dos provérbios (ver Ventoinha à sexta-feira )
3. Tenho a mania de dar a minha opinião quando não ma pedem
4. Tenho a mania de não gostar de futebol e ainda assim ser do Sporting
5. Tenho a mania de ficar à espera que a Ana também conte as suas manias

E porque também tenho a mania de não saber pôr links, aqui estão os cinco blogs a quem relanço o T.P.C. :
- GranMarta, Sergonov e QZ do Venteca
- Jubi do Pontapé de Canto e Jubi or not Jubi
- Kurtinaitis, Mr Wood e Plasma do Scratch the Mikas
- Lobo do Do Caminhar
- Carneiro do Minimal Karn (www.carneirodixit.blogspot.com )

sexta-feira, março 10, 2006

Iniciativa privada com alguma piada

Sente-se que algo está a mudar quando alguém faz obras num prédio perto da estação de comboios e lhe chama "Amadora Palace".
(mesmo não existindo qualquer referência ao número de estrelas e a cervejaria do lado manter orgulhosamente a porta aberta ao cheiro da febra e do courato)

quinta-feira, março 09, 2006

Barracada à Oliveira

Estava há pouco tempo no meu novo emprego quando me chamam ao telefone.
Era o médico da empresa, tinha de ir à consulta para poder assinar contrato e aquelas coisas... Ainda ao telefone: "Doutor eu não sei onde fica o seu gabinete". Do outro lado resposta pronta: "Não há problema. Sabe onde é o refeitório?" (Sim, é verdade, a minha empresa tem cantina e quando lá almoçamos passamos um cartão e descontam-nos a refeição directamente do ordenado!) "Sabe onde é o refeitório? Então encontramo-nos lá que eu vou ter consigo".
Ao chegar à cantina vejo o médico a aproximar-se de bata branca. Caminho em sua direcção com o ar mais saudável do mundo e já de mão estendida: "Doutor...". Uma abanar de cabeça acompanhado de: "Não não, eu sou o cozinheiro".
Ups!

Problemas

Tenho em minha posse uma carta que diz "Envelope 9 e meio" e não sei o que fazer com ela.

segunda-feira, março 06, 2006

Vícios impossíveis (dava um bom título para um filme)

Sou completamente viciada em televisão. Acho que já tinha disto isto aqui (deve ter sido para aí há um ano - que bom poder dizer isto, o blog já fez um aninho...sniff), bom... acho que já tinha dito isto aqui mas o que ainda não tinha dito, ou se calhar já (para aí há um ano também) é que só tenho quatro canais. Exactamente, não são quarenta, são quatro canais! Eu sei, já é suficientemente triste alguém ser viciado em televisão (nem dá moca nem deixa dar), para ainda por cima matar o vício com a RTP 1, a 2:, a SIC e a TVI.

O meu prato favorito é basicamente tudo o que mexa e tenha legendas no rodapé. Tudo o resto é lixo. Acontece que estas coisas com legendas passam normalmente a horas tardias. Como tenho de me levantar cedo e não aguento muitas noitadas (fico com dores de cabeça, agoniada, com tonturas, ou seja, fico com todos os sintomas de grávida mas sem estar), faço por dormir cedo porque preciso invariavelmente de oito a nove horas de sono. Então chega ali uma hora que é um verdadeiro suplício. Sou eu a querer ver as coisas com legendas e assim matar o vício e sou eu a ver que já só tenho sete horas e vinte e dois minutos para dormir.

Por exemplo, ao fim-de-semana irrito-me sempre porque tenho muito mais horas disponíveis para ver televisão mas acabo sempre por adormecer porque não consegui dormir até mais tarde porque acordo todos os dias à mesma hora e o meu organismo já se habituou a estes horários e então mesmo que queira ficar na cama até mais tarde não consigo e irrito-me porque depois à noite tenho sono e não posso outra vez ver as legendas que eu gosto. Ufa!

Isto tudo porque estão a começar os Óscares. Como eu gostava de ver tudo, tudo até ao fim... e amanhã não acordar completamente grávida.

sábado, março 04, 2006

Pontuação II

. A vírgula tem quase tanta incerteza como o ponto de interrogação. Nunca sabe bem onde se deve encostar, se com o advérbio ou perto do substantivo, sabendo de antemão que com o verbo nem pensar! Na proximidade do ponto e vírgula fica nervosa e as reticências deixam-na em suspenso...

Luas de Março

Quarto Crescente - Dia 06 às 20h16
Lua Cheia - Dia 14 às 23h35
Quarto Minguante - Dia 22 às 19h11
Lua Nova - Dia 29 às 10h15

(Mas se preferirem as Águas de Março, também se arranjam..)

sexta-feira, março 03, 2006

Pontuação

. Às vezes chego à conclusão que as reticências não eram... senão um ponto final. Ou, pelo contrário, que o ponto final afinal era uma coisa que tal-vez.

Charcutaria

. Passo vidas a encher, a encher... a encher chouriços e a engolir sapos, e sabem deus e o diabo quantas as vezes em que rio para não chorar. Por isso tenho cada vez menos paciência para que me lamuriem ao tímpano. Custa a todos, meus amigos.

. Guarnece-se da vontade ainda pura a tripa da pele e em seguida bota-se ao fumeiro. O segredo de saber quando está no ponto certo reside na dita maturidade.

. Colocavam bombas que não eram de Carnaval nos cintos anónimos tal qual quem constrói sem malícia flautas de Pã com canas; como quem seca presuntos logo depois da matança mesmo não comendo porco. A razão de ser era um bocado indiferente até para o profeta; bastavam umas caricaturas.

. Que venha, que venha
O tempo da apanha
E mais uma manha
P’ra minha gadanha.

quinta-feira, março 02, 2006

CANÇÃO DA MAIS ALTA TORRE

«
Que venha, que venha
O tempo da apanha.

Eu esperei tanto
Que tudo esqueci.
As raivas, o pranto
Acabam-se aqui.
E uma sede langue
Escurece-me o sangue.

Que venha, que venha
O tempo da apanha.

Como o descampado
De flores de abandono
Coberto, deixado
Ao incenso e ao sono,
Para voos atrozes
De moscas ferozes.

Que venha, que venha
O tempo da apanha.
»

Jean-Arthur Rimbaud (1854-1891)
Iluminações / Uma Cerveja no Inferno
(tradução de Mário Cesariny)