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segunda-feira, novembro 05, 2012

Novo exame de consciência

Isto de ter um filho especial, no meu caso com um diagnóstico de perturbação no espectro do autismo, faz-me muitas vezes desfrutar dele de uma forma muito ingrata.
Porquê? Porque passo os dias a desejar que o tempo passe rápido para ver que ele está a melhorar, a evoluir. O facto de ter nascido prematuro de vinte e sete semanas também não ajuda. Na verdade, desejei que o tempo andasse rápido desde o minuto em que ele nasceu. Primeiro para o ver a respirar sozinho, depois para ganhar peso, depois para o levar para casa, and so on, so on.
Se for a ver bem, ando nesta corrida contra o tempo desde sempre. Continuou quando quis que ele andasse como os outros meninos, que fizesse o que todos fazem. Hoje quero que o tempo passe para ele desatar a falar. E quando olho para trás descubro que passei estes três anos não tanto a desfrutar do que ele é, e de como ele é, mas a ansiar pelo que ele seria. Esta é uma luta difícil de contrariar e que me deixa triste, amargurada, com saudades de fases pelas quais ele passou e que parece nem sequer ter vivido.
Lembro-me de uma vez uma das técnicas que o segue me dizer que eu estava mais preocupada em que ele agarrasse bem num livro, do que em deixá-lo divertir-se com as cores, as texturas ou os bonecos que via nele, pouco importando nesse caso como estava a sua motricidade fina.
Mas que fazer? Que fazer quando só quero que ele seja igual aos outros meninos? Esqueço-me é que este tipo de problema não acaba. Ajo como se estivesse à espera que ele chegue onde os da idade dele estão. E que um dia possa dizer "pronto, ele já está bom. Vamos lá então curtir esta cena de ser mãe". No fundo, acho que ainda não aceitei a especificidade dele. Tenho andado sempre a querer que o Rodrigo seja outra coisa que não é. Perceber o que ando a fazer é doloroso. É ingrato. Mas cair na realidade, como aconteceu agora, traz-me novas missões. Estarei atenta, vigilante, dar-lhe-ei todas as ferramentas para que consiga ser mais feliz e autónomo. Mas farei tudo para tirar mais partido deste meu bebé de três anos que, por ser diferente, não merece ser obrigado a entrar nesta corrida, cuja fita da meta teimo sempre em avançar sem nunca se conseguir (nem ele nem eu) saborear o verdadeiro sabor da vitória.

Ufa, que isto andava aqui entalado há tanto tempo.

29 comentários:

Sexinho disse...

Como te admiro!
É legitimo tudo isso que sentes e desejas e só o fazes porque lhe desejas o melhor!
Tudo o que posso fazer daqui é enviar-te um beijo e um abraço apertado.
De uma mãe para outra.

Lila disse...

Não sei se serve de consolo, mas eu, mãe de um menino dito normal, tambem ando sempre a desejar que o tempo passe, para o ver crescido. Acho que isso é algo comum a todas as mães e não só aquelas que encontram mais dificuldades com os seus filhos. É triste, porque depois temos saudades do que já passou, mas eu acho que faz parte da nossa natureza.
não se culpe por isso.
Está a fazer um trabalho excelente!!!!

Juanna disse...

Anette, as minhas filhas não têm qualquer perturbação de espectro nenhum e eu passo o tempo a desejar o próximo passo. Provavelmente tu tens mais ânsia nisso porque, apesar de todos os prós do Rodrigo, parece-me que qualquer mãe quer ver o seu filho ser "igual" aos outros. Não te martirizes, agora que percebeste que não há assim tanta pressa, desfruta dele, desfruta de ti, aprende com as tuas vitórias e erros. Lembra-te sempre de uma coisa: ele está a aprender a crescer e a ser filho, mas tu estás a aprender a crescer e a ser mãe.

Anónimo disse...

Tão mas tão bonito... Que lucidez, que discernimento, que humildade!
Parabéns a si pelo filho especial que tem e parabéns ao seu filho pela mãe maravilhosa que escolheu. Pelo que escreve, vai-se percebendo porque foi a escolhida e porque não podia ser outra.
Desejo-vos toda a felicidade do mundo.
Sónia

Helena disse...

Pouco fica por dizer depois de ler um texto tão verdadeiro e honesto como este. Fala de sentimentos bem reais para qualquer mãe e mais que legítimos na sua situação. Que continue a ter essa força enorme que demonstra ter. Um beijinho

Fernanda Loureiro disse...

Coisas sentidas e verdadeiras de uma verdadeira mãe.
Temos consciência que não estamos a aproveitar todos os momentos.. só queremos o melhor para eles e é tão difícil atingir este equilíbrio.
Admiro muito a sua coragem. Um grande beijinho

Anette disse...

Ai que bom não estar sozinha neste barco. Obrigada pela força, já chorei com o que aqui escreveram.

Pipa disse...

Não podia deixar de comentar. És das blogueres que mais curiosidade me dá em conhecer, por isto, és simples, és feita de uma fibra diferente,acredito ! :) comecei a andar tarde, a falar tarde, a minha mãe deu-me comida á boca até aos 12 (vergonhoso ,ahah) enquanto que o meu irmão sempre foi muito despachado. E é o que ela diz: cada bebé demora o seu tempo...aproveite que num instantinho ele já está a tirar a carta de condução ! Beijoca

Anónimo disse...

Não consigo passar e não comentar. Como mãe e professora encontro no teu blog um manancial de informação que me agrada muito. Como mãe de duas miúdas normais assumo que também faço o mesmo: sempre à espera de algo que há-de vir, depois a sensação de que não vivi como devia o que já passou. Pelos vistos, é recorrente, deve fazer parte da condição de mãe. Um abraço.
Gabriela

Anónimo disse...

Fez muito bem em desabafar seja de que forma for !

Ana Costa disse...

Mãe de duas crianças ditas normais. E com a mesma sensação. Que deixem de chorar. Que durmam toda a noite. Que tomem banho sozinhas. Que possam ficar em casa enquanto eu vou ao supermercado. Que passem a ir sozinhas para a escola...
Não se martize. Acompanho - de forma silenciosa - o seu blog e acho que ninguém que se ponha no seu lugar pode dizer com honestidade que faria melhor. Fazemos todos os possíveis dentro nas nossas limitações. As super mulheres são só cartoons.
Muitas felicidades.

Patrícia Simões disse...

Bela prova de humildade que demonstra ao escrever este texto. Tal como todas as outras Mães que já comentaram, também eu anseio sempre pelas novas etapas dos meus filhos, pelas coisas boas que as novas fases trarão.
Só quando vou aos arquivos do meu blogue é que me dá aquele frio na barriga (serão os tais exames de consciência?) por já estarem mais crescidos do que estavam, por já terem ultrapassado tantas fases... e por já não fazerem coisas únicas de cada uma dessas fases...
Enfim, ser Mãe também é isto...

Helena disse...

Fiquei de nó na garganta... emocionada... comovida... porque me reví em cada letrinha...
Bem... não estou só... e tenho sorte, porque há casos piores... Passou-me de relance pela mente. Mas sei que lá bem no fundo vou sempre querer a minha menina perfeita... ainda que tente com todas as minhas forças aceitar a realidade...

SMS disse...

És maravilhosa, sabias?

Anónimo disse...

Que sorte tem o Rodrigo por ser filho da super-mãe. E que sorte temos nós todos por existir alguém que é capaz de descrever tão maravilhosamente o que é a vida. Paulo baldaia

Anónimo disse...

Admiro-a imenso e nem a conheço. Que testemunho fabuloso.
e não digo mais nada para não estragar isto!

Muito bom mesmo. Keep calm, and carry on!


Sara

Anónimo disse...

Acho que as suas palavras entram no coração e na alma de todos os que os que são pais...
É esta uma das condições de ter filhos...querer e desejar o melhor para eles...sem perceber que muitas das vezes já o têm!!

Anónimo disse...

Ufa...já está.A M faz tres anos em Dezembro e o como o tempo passa!Dos primeiros meses de vida dela não tenho muitas lembranças,entrei em depressão pos-parto.Tudo o que queria na altura era que ela crescesse rapido para fugir aquela rotina.Hoje tudo é diferente mas a mágoa fica,passei tanto tempo a querer ser perfeita que perdi muitos momentos.A lição que tirei de tudo foi que nada nem ninguem é perfeito.Força...tudo vai correr bem.Continua a escrever.

Anónimo disse...

Mas todos passamos por isso! Claro que o teu sentimento está ampliado pela especificidade do R. Mas também desejamos que os nossos andem mais cedo, falem mais cedo, leiam mais cedo, etc, que os outros miúdos todos. E claro que tem um lado menos bom mas tem o lado positivo de incentiva los estimula los para que saiam da sua zona de conforto e evoluam. E sabe mesmo bem vê los felizes e realizados pelas pequenas grandes conquistas.
sonia

Maria Eugênia disse...

Sabe que tenho uma menina de 4 e agora um menino de 1 ano, hoje mesmo comentava com meu marido que não consigo lembrar de montes de coisas que a Filipa fez para poder comparar agora com as coisas que o Gui faz, e lá está, a ansiedade que temos que o tempo passe, que vá tudo rápido , que essa fase acabe, faz com que deixemos de desfrutar as coisas boas...Isso só para dizer que você é muito mais normal do que julga ser. Acho que todas as pessoas anseiam o dia de amanhã e esquecem de viver o de hoje.
Já há algum tempo me propus a pensar pelo menos uma vez por dia o quanto sou feliz, porque detestaria usar aquela frase medonha¨ Eu era feliz e não sabia¨ , portanto decidi todo dia agradecer e por 5 minutos curtir as crianças, o resto é mesmo só correria.
Adoro seu blog.
Maria Eugênia
www.oceanoquenossepara.blogspot.com

gralha disse...

Post lindo e maravilhosamente lúcido, uma lufada de ar fresco na blogosfera e uma inspiração para muitas mães de todos os tipos de meninos (eu incluída). Obrigada.

Mafaldix disse...

Admiro-te muito e nem imagino a angústia que tens dentro do coração.

donadecasaaos24 disse...

Assim que li soube que tinha de comentar, porque é preciso alguma coragem para "dizer" em voz alta aquilo que expressou aqui, e logo percebi que não saberia o que dizer. Força, o caminho é longo, para ele e para si, mas não o fazem sozinhos. Beijinhos

http://alguemquemecale.blogspot.pt/

Anette disse...

E se eu vos disser que já reli os vossos comentários, que me lembre, pelo menos doze vezes? OBRIGADA

Tacha disse...

És a maior!e por isso é q só tu podias ser a mãe do Rodrigo. <3

Unknown disse...

Que coragem! Faz bem desabafar... costumo seguir o seu blog assim de modo muito discreto... sei que me vou tornar repetitiva mas não há outra forma a dizer. Também sou mãe de uma menina com 13 anos e um menino com 10 meses. Também eu ansiei pelo dia de amanhã com a minha filha e tenho a sensação de não ter desfrutado como devia... com o segundo prometi a mim mesma que não o ia fazer mas... é intuitivo... dou comigo a pensar: nunca mais anda sozinho, nunca mais come sozinho e da nossa comida, nunca mais larga as fraldas... enfim depois fico com peso na consciencia e penso: tem calma, ainda é cedo, tudo leva o seu tempo.
è só isso que também lhe posso dizer: tenha calma, tudo leva o seu tempo, disfrute o dia a dia, cada conquista, cada descoberta do Rodrigo. Beijinhos aos 2

IPQ disse...

Querida Ana, não sejas tão dura contigo. O teu Rodrigo é um menino especial, não é igual aos outros. Mas não é menos do que os outros por isso. Percebo perfeitamente a tua luta e o teu esforço para que ele possa ter as ferramentas de que precisa para se integrar neste mundo cão. Mas não sejas tão dura contigo. Aprecia a mão dele na sebe. Eu apreciei.
Beijos muito grandes. És maravilhosa, sabias?

Yocoyo disse...

Hoje pela primeira vez passei no teu blog e este post chamou-me a atenção.
Tenho um filho de 12 meses com glaucoma congénito. Foi diagnosticado e operado quando fez 1 mês.
Também eu no início ansiava que o desenvolvimento dele fosse rápido, para podermos perceber se existia algum dano no nervo óptico.
Depois percebi que ele tem o seu ritmo próprio, o seu desenvolvimento que não pode ser comparado com as outras crianças e "relaxei" no sentido de aproveitar o primeiro sorriso, a primeira gracinha, a primeira vez que olhou para mim e percebeu que eu era a mamã.
Graças a Deus as coisas estão estabilizadas agora. Vou aproveitar ao máximo cada minuto do meu filho, dentro do ritmo dele.
Acredito que estes anjinhos que temos na nossa vida, fazem-nos ver e sentir a vida de um modo especial.
Vai correr tudo bem.
Beijinhos

Sandra disse...

Já senti isto tantas vezes... O meu filho tambem tem atraso no desenvolvimento e todas as conquistas são tão batalhadas, tão sofridas. Só quero que ele cresça rapidamente para que ele chegue onde todos os outros meninos estão. E é uma pena porque estamos tão preocupadas em fazer o melhor por eles que as vezes nos esquecemos de descontrair e simplesmente gozarmos os nossos bebes.