«(...) Battista não se perturbou por tão pouco:
- Você sabe, Molteni, que, ouvindo-o falar, creio rever-me a mim próprio quando tinha a sua idade?
- Ah, sim? - balbuciei desconcertado.
- Sim... eu era muito pobre - prosseguiu Battista servindo-se de mais vinho - e também eu tinha, como você diz, ideiais... Quais eram esses ideais? Não saberei dizê-lo agora, e até nem o saberia nessa altura... mas tinha-os... talvez não tivesse este ou aquele ideal, mas o ideal com I grande... (...) O ideal, quando não se sabe precisamente o que se quer, é melhor esquecê-lo, pô-lo de parte... e só depois, quando se põe pé em terreno sólido, é preciso recordá-lo... a primeira nota de mil que se ganha, eis o ideal... (...)
- (...) Quer saber o segredo do sucesso, Molteni?...
- Pôr-se na fila da vida, como diante da bilheteira, na estação... chega sempre o nosso momento se se tem paciência e não se muda de fila... Chega sempre a nossa vez, pois que o empregado da bilheteira dá a cada um o seu bilhete... a cada um segundo os seus méritos, bem entendido... aos que devem e podem ir longe, quem sabe?, um bilhete para a Austrália... aos outros, menos ambiciosos, um bilhete para uma viagem mais curta, Capri, por exemplo. »
Alberto Moravia in O Desprezo
1 comentário:
Eu também ainda me mantenho na mesma fila da vida à espera que alguém se lembre de me dar um bilhete, nem que seja ali para Badajoz.
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